[TP 3] Estudo de caso: Jardim Edite
- Lia Soares
- 4 de out. de 2020
- 4 min de leitura
Atualizado: 11 de out. de 2020
O conjunto habitacional Jardim Edite é um projeto dos escritórios MMBB Arquitetos e H + F Arquitetos na cidade de São Paulo. Consiste em um projeto de habitação de interesse social, engloba três torres de 17 andares (60 apartamentos em cada) e duas lâminas com dois blocos de quatro andares, sendo as lâminas uma creche, uma unidade básica de saúde e um restaurante-escola e os blocos contendo mais 72 unidades de moradia no total. O empreendimento possui cerca de 25 mil metros quadrados, e a obra foi concluída em 2010.

Conjunto Habitacional Jardim Edite. Croqui da autora.
Localização do edifício. Fontes: Google Maps; Snazzy Maps.
O projeto tinha como difícil objetivo a integração do lote, que era ocupado por uma favela, com a rica vizinhança. A favela se localizava próximo à ponte estaiada de São Paulo, que acabava de ser inaugurada em 2008 e se tornara o novo cartão postal da cidade. A área se tornou um novo centro financeiro e de serviços da capital paulista.

Conjunto Habitacional Jardim Edite, ao fundo
a Ponte Estaiada de São Paulo. Croqui da autora.
Para atender às demandas dos moradores e da região, estimulando o uso e dando vida ao espaço, os arquitetos optaram pela sobreposição de usos, adotando um programa de necessidades diverso, incluindo a creche, a unidade básica de saúde e o restaurante-escola ao projeto. O restaurante-escola é o principal exemplo da interação entre o conjunto habitacional e a cidade, pois se abre tanto aos moradores do conjunto quanto aos frequentadores das grandes empresas do entorno, proporcionando o encontro entre a população da comunidade que está se profissionalizando e o público que utiliza esse serviço.

Imagem por Nelson Kon, edição pela autora. Fonte: Archdaily.
PAISAGEM
Uma das preocupações dos arquitetos era que o lote não se tornasse um gueto e também evitar a sua favelização. O zoneamento misto do projeto casa com a ocupação mista dessa área da cidade, e essa característica, considerada pelos arquitetos a mais fundamental, foi essencial para a integração do conjunto, contribuindo para que não se isole da cidade. A morfologia e volumetria adotadas foram semelhantes às dos prédios vizinhos, procurando tornar a arquitetura parte do panorama urbano, e não uma excessão. A relação com a cidade foi ressaltada com um recuo de 20 metros do limite do lote, que foram convertidos em calçadas largas dotadas de vagas de estacionamento de uso comum. Com o uso público do térreo, os edifícios se abrem naturalmente para a cidade.

Morfologia semelhante à dos demais edifícios paulistas. Croqui da autora.
POLÍTICA E TERRITÓRIO
Um dos desafios do projeto foi conceber uma habitação social no meio de uma área que estava mudando suas dinâmicas, se enriquecendo e se gentrificando. Como evitar a expulsão da população de menor renda que já habitava ali?
A solução adotada pelos arquitetos foi usar um programa misto e incentivar a interação entre o edifício e a cidade, atendendo não só as demandas dos moradores, como também as dos frequentadores dos edificios vizinhos. O térreo é de uso da cidade, com uma creche, uma unidade básica de atendimento e um restaurante-escola. As largas calçadas com vagas para carros, também de uso público, criam movimento e trazem mais segurança. O arquiteto Milton Braga, do MMBB Arquitetos, reflete: “A calçada é viva, cheia de gente sempre, estabelecendo uma espécie de controle social dessas áreas, com mais segurança e tudo aquilo que qualquer cartilha de urbanismo recomenda”.
Criaram também um projeto simples, de fácil construção (concreto aparente e moldado in loco) e manutenção, de forma que não se degrade facilmente, enquanto ainda possui qualidade em sua concepção, com estratégias de conforto térmico e eficiência energética.

TECTÔNICA
Segundo o arquiteto e historicista Kenneth Frampton, o conceito de tectônica representa a dimensão material, construtiva e tátil da arquitetura. Outros teóricos do século XX diziam que tectônica é a relação entre a lógica construtiva e a expressão artística da arquitetura.
Interpretando esse conceito como a materialidade da obra, a tectônica do conjunto do Jardim Edite seria muito mais do que sua lógica construtiva de baixo custo, mais do que sua estética "padrão" de edifício em altura de São Paulo. Sua relação especial com a cidade, o tipo de interação que propõe entre os moradores e os novos frequentadores da mais recente zona financeira paulista, é soma de todas as intenções dos projetistas no desenvolvimento no projeto, desde a preocupação com a morfologia até a decisão pelo programa de necessidades misto.
É com exemplos assim que demonstram como o impacto urbano de um projeto arquitetônico não pode ser ignorado e deve ser levado em consideração desde o princípio, principalmente em projetos de escalas maiores, como edifícios. A qualidade de vida humana não se resume a onde se mora, mas também a onde se circula, se trabalha, se vive.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL, Izabel. Quase tudo que você queria saber sobre tectônica, mas tinha vergonha de perguntar. Revista do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Fauusp, São Paulo, v. 26, n. 16, p. 148-167, dez. 2009. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/posfau/issue/view/3587. Acesso em: 10 out. 2020.
BARROS, Cida. Habitação integradora. Disponível em: https://www.galeriadaarquitetura.com.br/projeto/mmbb-arquitetos_/jardim-edite/889. Acesso em: 04 out. 2020.
VADA, Pedro. Conjunto Habitacional do Jardim Edite / MMBB Arquitetos + H+F Arquitetos. 2019. Disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-134091/conjunto-habitacional-do-jardim-edite-slash-mmbb-arquitetos-plus-h-plus-f-arquitetos?ad_medium=gallery. Acesso em: 4 out. 2020.
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